Democracia e a realidade
 
Por Cláudio Lembo
Advogado, professor e ex-governador de São Paulo pelo DEM/PSDB

Quando se examina o cenário político nacional, o observador se depara com um quadro de imensa complexidade. Primeiro, ele deseja saber que tipo de democracia se encontra presente em nosso País.
 
Ai, o observador sente dificuldade inicial. Como enumerar os elementos que compõe uma verdadeira democracia? Constata que há liberdade de pensamento.
 
É um dado positivo. Todos têm opinião própria sobre os mais diversos acontecimentos. Não há qualquer obstáculo ao livre pensar. É conquista que, em toda a parte, custou uma enormidade de vidas.
 
Surge, após esta constatação, uma nova indagação. Apresentam-se confiáveis as informações recebidas pela cidadania? Aqui as amostras recolhidas levam a um registro.
 
As informações são geradas por centrais únicas de notícias. Basta ver as manchetes dos jornais impressos: são iguais, apesar de originárias de redações diversas.
 
Claro que a cidadania, neste caso, recebe uma versão uniforme dos fatos políticos e sociais. Isto não permite que se instale, no interior das consciências, a boa dialética.
 
Só esta conduz às sínteses individuais. Ou seja, a de cada cidadão. A uniformidade de pensamento é maléfica em todas as atividades humanas, particularmente na política.
 
A política exige pluralidade de visões do mundo. Nela nada pode se apresentar linear. Só as ditaduras contam com o pensamento único. Fora dele geram-se as perseguições e as conseqüentes prisões.
 
A essência da democracia é a liberdade. A liberdade deve produzir pensamentos díspares. Jamais a unicidade e a ortodoxia. Já se passaram os tempos dos dogmas. 
 
Esta uma deficiência de nossa democracia. A ausência de pluralidade informativa. Tudo é igual. O pensamento único elaborado por publicitários deforma a verdade.
 
No passado, os teólogos impunham uma só verdade. Hoje, são eles, os publicitários, que desejam conduzir a vontade coletiva. Procuram alterar valores e costumes.
 
Às vezes agem de maneira positiva. Em política, porém, o agir é sempre negativo. Porque distorcem a verdadeira identidade dos candidatos. Transformam fantoches em lideres.
 
Criam falsas figurações da realidade social. A partir do pressuposto de que agir, politicamente, é gerar esperanças, produzem configurações inalcançáveis.
 
 Os partidos políticos, por sua vez, dentro dos costumes da democracia pátria, mostram-se incapazes de gerar corpos de doutrina de acordo com as diversas visões da sociedade.
 
Todos se mostram iguais no agir e no elaborar propostas. Os programas partidários gratuitos – no rádio e na televisão – são pobres de conteúdo. Sempre as mesmas falas em personagens diferentes.
 
Não se busca mais, na democracia nativa, a obtenção de novos traços doutrinários e a geração de novas idéias. Esquerda, direita e centro não diferem em nada. Um só objetivo: a conquista de cargos eletivos.
 
Há crises no setor de abastecimento das grandes cidades, especialmente São Paulo. Nenhuma análise convincente é concretizada por parte dos veículos de comunicação ou pelos partidos políticos.
 
Existe um silêncio imposto sobre a calamidade que se anuncia: a falta de água. Os antecedentes que geraram o atual estado de coisas não são examinados.
 
Certamente, em algum momento, houve desídia. Quem a praticou? Na democracia brasileira, conduzida por centros de inteligência altamente remunerados, as crises anunciadas não têm autores.
 
É matéria abstrata. Não se insere no espaço política. Coloca-se no campo da metafísica. 
 
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