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O anti-consenso de Washington

 
Antes de ontem, em reunião conjunto do Instituto Lula com a Fundação Jean Jaurès, do Partido Socialista francês, foi divulgada uma nota conjunta histórica, encabeçada por Lula e pelo presidente francês François Hollande.

Nela, convocam-se instituições, fundações e demais entidades ligadas à social-democracia para definir um novo modelo de governança global, baseado na experiência brasileira pós-crise de 2008.

Entenda melhor o alcance dessa manifesto.

Desde a Revolução Industrial inglesa, duas linhas de pensamento dominaram as discussões sobre políticas econômicas nacionais.

Uma delas, internacionalista, defendia o primado do mercado, limitava as ações regulatórias e reduzia o grau de intervenção das políticas nacionais. Crescia em períodos de esgotamento dos modelos nacionais, acumulava forças, sobrepunha-se a toda forma de regulação, privilergiava o livre fluxo de capitais e, depois, esgotava-se em seus próprios exageros, imersas em grandes crises globais.
A segunda, nacionalista, impunha controles aos capitais, práticas protecionistas, graus crescentes de intervenção estatal e, assim como a primeira escola, acabava se esgotando nos seus próprios excessos de intervencionismo.

De certo modo, desde o século 19 a economia mundial capitalista oscila entre esses dois extremos.

Os modelos de intervenção do Estado assumiram um caráter desenvolvimentista nos países do terceiro mundo e um caráter social nos países desenvolvidos. Nesse segundo grupo gerou a social democracia europeia, responsável pelo avanço do chamado estado do bem estar social.
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Do pós-Guerra até os anos 60 vigorou a linha mais intervencionista. No plano global, foi o período de predominância das grandes instituições multilaterais - FMI, Banco Mundial, BIRD -, do controle de capitais e das oscilações cambiais.

De 1972 em diante - quando o presidente norte-americano Richard Nixon desvinculou o dólar do ouro - predominou um período de gradativa liberalização financeira. No início dos anos 90, um documento denominado de "Consenso de Washington" sugeriu as linhas básicas de política econômica a serem adotadas pelos diversos países que pretendessem se integrar à globalização.
Através de Fernando Henrique Cardoso, o Brasil foi um seguidor religioso do receituário, deixando de lado investimentos públicos e políticas sociais para se concentrar exclusivamente na criação de um ambiente propício ao grande capital. Supunha-se que, atendidas suas exigências, o desenvolvimento viesse automaticamente.

Essa ilusão atravessou os dois governos FHC e o governo Lula até a grande crise de 2.008.

De lá para cá, houve mudanças gradativas na política econômica interna. Constatou-se que políticas sociais, em vez de passivo, tornou-se um enorme ativo nacional, na medida em que gerou um mercado de consumo dinâmico. Em todas as crises do governo FHC, a reação automática era a de um pesado pacote fiscal que aprofundava ainda mais a crise.
Nesse mesmo período, a Europa se afundou na maior crise desde a Segunda Guerra, fruto de políticas econômicas ortodoxas. Pior: iniciou o desmonte do seu estado de bem-estar, um dos grandes avanços civilizatórios do século.

É nesse quadro que se situa o manifesto, em cima de grandes forças globais atrás de um discurso que unifique as ações e permita a superação do modelo e da crise atuais.
As virtudes da globalização
Começa pelo reconhecimento da inevitabilidade da globalização: "A globalização é um imenso desafio com o qual se confronta a humanidade. Ela tem um poder formidável de mudança para todas as sociedades: a mudança econômica, com a intensificação das trocas; a mudança cultural, pois essas trocas possibilitam a circulação de ideias e a transformação das práticas culturais e de costumes; a mudança política".

Os problemas da globalização

Depois, aponta os problemas atuais: "A globalização, da forma que ocorre atualmente, está longe de satisfazer as aspirações que legitimamente suscita. A crise econômica internacional agrava a concorrência entre os países e as sociedades. Ela atinge os mais vulneráveis, particularmente os trabalhadores e os jovens. (...) Ela conduz governos a adiar as decisões necessárias para prevenir o aquecimento global".

A críticas às políticas de austeridade

Depois, uma crítica às políticas de austeridade adotadas pela União Europeia: "Isoladas, (...)  mostraram seus limites para encontrar a saída da crise. A retomada ainda não esta garantida, ao mesmo tempo em que os direitos econômicos e sociais estão ameaçados. É imprescindível que sejam adotadas políticas de crescimento. Somente assim a globalização poderá garantir o respeito à coesão social e ao meio ambiente".

A nova governança

A defesa da nova governança: "Uma nova governança é necessária para regular os conflitos entre as nações e garantir a paz e, de outro, permitir que cada nação realize o modelo de sociedade que escolheu. Os poderes públicos devem garantir que todos tenham oportunidades de desenvolver suas capacidades individuais. Devem também trabalhar em prol da perenidade do meio ambiente para as gerações futurasemail:.

Novo mundo em marcha

Depois, aponta as mudanças em curso: "A sociedade civil mundial se tornou uma realidade tangível. Políticas públicas inovadoras e outros modos de governar surgem em todos os continentes, particularmente nos países emergentes e em desenvolvimento. As instâncias multilaterais também estão se reconfigurando. A constituição do G20 reflete a mudança dos equilíbrios mundiais, mas seu impacto ainda limitado ilustra a dificuldade dos governos de chegarem a um acordo e de agir de forma concreta".

A conclamação

Finalmente a conclamação: "Os riscos que atualmente ameaçam a humanidade são grandes demais para nos focarmos apenas em uma gestão de curto prazo. Fazemos uma conclamação em defesa da confiança na capacidade humana de se reinventar e do poder criador de nossa sociedade-mundo, para sair definitivamente da crise e construir as bases de um futuro harmonioso que possa ser compartilhado por todos".
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