Panorama tira-fôlego na região das Nascentes Sagradas, na Colúmbia Britânica, norte do Canadá
O etnógrafo canadense Wade Davis explora locais escondidos no mundo todo . Mas, nesta palestra curta porém intensa, ele nos instiga a salvar um paraíso em seu quintal, o norte do Canadá. As Nascentes Sagradas (Sacred Headwaters, na Colúmbia Britânica), remotas e cristalinas, estão sob ameaça porque elas encobrem areias ricas em betume. Com fotos belíssimas, Davis faz uma pergunta difícil: Como podemos equilibrar a necessidade de combustíveis da sociedade moderna com a urgência de proteger essa natureza selvagem tão magnífica?
Wade Davis, durante sua palestra no TED
A National Geographic Explorer-in-Residence, descreve Wade Davis como "uma rara combinação de cientista, professor, poeta e apaixonado defensor de todas as formas de biodiversidade".
Davis é talvez o mais articulado e influente defensor das culturas indígenas em todo o mundo. Com treinamento em antropologia e botânica na Harvard University, ele tem viajado ao mundo todo para visitar povos indígenas e documentar suas práticas culturais em livros, fotografias e filmes. Nas suas palestras, ele não esconde sua preocupação ao ritmo no qual muitas culturas e línguas estão desaparecendo. "50 por cento das 7 mil línguas ainda existentes no mundo não são mais faladas por crianças. E cada língua é uma antiga floresta da mente humana", ele diz.
Tradução integral da palestra de Wade Davis:
"Esta não é uma história sobre o Tibete e não é uma história sobre a Amazônia. Não os levarei para o Ártico, à vida dos Inuit, ou para as areias escaldantes do Saara. Na verdade esta é uma história do meu próprio quintal.
É uma terra conhecida pelo povo Tahltan e por todas as tribos da Colúmbia Britânica como Nascentes Sagradas, origem dos três grandes rios dos salmões, o Skeena, o Stikine e o Nass. É um vale onde, num dia longo, talvez, você possa seguir as pegadas do urso pardo e do lobo e beber das fontes de água que foram berço de grandes civilizações da costa noroeste. É um local tão belo. É o local selvagem mais deslumbrante em que já estive. É o tipo de local em que nós, canadenses, poderíamos lançar a Inglaterra, e nunca a encontrariam. John Muir, em 1879, percorreu apenas o terço inferior do rio Stikine, e ficou tão encantado que o chamou de Yosemite de 150 milhas. Ele voltou à Califórnia e deu o nome daquele rio de encantamento a seu cachorro. Nos estados americanos de território contínuo, a maior distância em que você consegue isolar-se em uma rodovia que tenha manutenção é 20 milhas. No quadrante noroeste da Colúmbia Britânica, uma área de terra do tamanho do Oregon, há uma rodovia, uma fita estreita de asfalto que desliza pelos flancos das Montanhas da Costa até o Yukon. Segui por essa rodovia, no início da década de 1970, logo depois que foi construída, para trabalhar como o primeiro guarda florestal, na região selvagem de Spatsizi. As obrigações do meu trabalho eram maravilhosamente vagas: avaliação desse local selvagem e relações públicas. Em duas temporadas de quatro meses, não cheguei a ver uma dúzia de pessoas. Não havia ninguém para as relações públicas.
Mas, ao longo dessas caminhadas, deparei com o túmulo de um velho xamã que me levou a um encontro com um homem notável: Alex Jack, um ancião Gitxsan, um chefe que viveu como caçador naquelas terras durante toda sua vida. E ao longo de 30 anos, registrei contos tradicionais de Alex, a maioria relatos mitológico de Wy-ghet, o transformador embusteiro do conhecimento Gitxsan que, em sua loucura, ensinou o povo a viver naquelas terras. E, pouco antes de Alex morrer, aos 96 anos, ele me deu um presente, Era uma ferramenta esculpida em osso de caribú, pelo seu avô, em 1910, e se tratava de um instrumento especializado, usado por um caçador, para descolar a pele das pálpebras de lobos. Foi somente quando Alex morreu que percebi que as pálpebras, de certa maneira, eram as minhas, e tendo feito tanto para permitir que eu aprendesse a ver, Alex, a seu modo, estava me dizendo adeus.
Bem, o isolamento tem sido a graça salvadora deste lugar extraordinário, mas hoje o isolamento pode ser sua condenação. Vocês ouviram tanto sobre a exploração da areia betuminosa, a controvérsia sobre Keystone e o oleoduto Enbridge, mas estes são apenas componentes de um tsunami de exploração industrial que está varrendo toda a área selvagem do norte do Canadá. Apenas para o território Tahltan, há 41 propostas industriais de grande porte, algumas com muitas promessas, outras de grande preocupação. Na Montanha Todagin, venerada pelo povo Tahltan como um santuário da vida selvagem no céu, lar da maior população de carneiros da montanha no planeta. A Imperial Metals -- a 75ª maior companhia de mineração do Canadá -- tem assegurada a permissão de estabelecer uma mina de cobre e ouro a céu aberto que processará 30.000 toneladas de rocha por dia, durante 30 anos, gerando centenas de milhões de toneladas de rejeitos tóxicos que, de acordo com o projeto, serão simplesmente lançadas nos lagos das Nascentes Sagradas. Nessas mesmas Nascentes, a Shell Canada tem planos para extrair gás metano de veios de carvão que subjazem em um milhão de acres, fracionando o carvão com milhões de galões de produtos químicos tóxicos, fixando talvez uns 6.000 poços e, por fim, uma rede de rodovias e dutos e poços vistosos, tudo para gerar gás metano, que muito provavelmente irá para o leste a fim de impulsionar a expansão do betume.
Por mais de uma década, o povo Tahltan, ambos os clãs, Wolf e Crow, resistiram a essa investida em sua terra natal. Homens, mulheres e crianças de todas as idades, anciãos em cadeiras de rodas, bloquearam a única rodovia de acesso ao interior. Para eles, as Nascentes são como uma cozinha. São um santuário. São o campo santo de seus ancestrais. E aqueles que realmente o possuem são as gerações ainda não nascidas.
Os Tahltan têm sido capazes de, com o apoio de todos os canadenses que vivem a jusante, todos os políticos locais, resistir a essa investida em sua terra natal, mas agora tudo pende na balança. Decisões que serão tomadas neste ano literalmente determinarão o destino deste país. Os Tahltan clamam pela criação de uma reserva de herança tribal que irá separar a maior área protegida na Colúmbia Britânica. Nosso objetivo é não só ajudá-los a fazer isso mas ainda encorajar nossos amigos, as pessoas boas na Shell, a não apenas se retirar das Nascentes Sagradas, mas também a reunir-se a nós enquanto fazemos o notável, o extraordinário: separar uma área de proteção que será para sempre não apenas as Nascentes Sagradas do povo Tahltan mas também as nascentes sagradas de todas as pessoas do mundo.
Os Tahltan precisam de sua ajuda. Nós precisamos de sua ajuda. E se vocês quiserem se juntar a nós nesta grande aventura, por favor, entrem em contato comigo em seguida.
http://www.brasil247.com/pt/247/revista_oasis/97413/As-Nascentes-Sagrada...
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